Além da Comunicação

Um dos princípios mais elementares da sociologia é a natureza gregária do ser humano. Não existe sociedade de uma só pessoa. As pessoas precisam agrupar-se para conquistarem seus objetivos, realizarem suas metas, transformarem seus sonhos em realidade. Praticamente tudo que um ser humano precisa só pode ser conseguido através de outro ser humano. E para conseguirmos que outras pessoas nos dêem o que queremos precisamos aprender a comunicar de forma eficaz.

A dificuldade na comunicação é responsável por praticamente todos os desastres da humanidade. A pessoa comunica alho e o outro entende bugalho. Se o volume da televisão está baixo, pode não ser suficiente dizer: “a televisão está muito baixa”. Algumas vezes é imprescindível dirigir-se ao receptor da mensagem e dizer em alto e bom som: “você poderia aumentar o volume da televisão?”. Alto e bom som, não significa gritar. Precisamos estar atentos ao volume da nossa voz e as expressões do nosso rosto, bem como nossa postura, e atitude enquanto falamos.

O simples fato de eu ter falado a frase acima de forma clara e explícita não implica necessariamente que o meu interlocutor compreendeu exatamente o que eu estou querendo dizer. Se fiz o pedido e não obtive a resposta esperada, alguma falha houve no processo de comunicação. Na maioria dos casos, o emissor da mensagem assume que o receptor está de má vontade, está zangado, acordou com o pé esquerdo... Porém, assumir esses pressupostos como verdadeiros é correr o risco de contribuir de forma desastrosa para o colapso do processo da interação social no evento da comunicação.

O significado da mensagem é a resposta que você obtém. Se comunico alguma coisa para o meu interlocutor e obtenho uma resposta diferente do que eu esperava, não posso tirar conclusões precipitadas e pensar que o outro está de má vontade, está zangado, mau humorado... Preciso verificar o motivo porque o outro não atendeu a minha solicitação. Ele pode não ter entendido o que falei, apesar de eu pensar que falei de forma clara suficiente, posso ter falado baixo demais, a pessoa poderia está distraída, mesmo olhando para mim, está ouvindo seus próprios pensamentos.

Não se pode descartar a possibilidade de o interlocutor está realmente se recusando a atender a nossa solicitação. Mas essa deve ser apenas um aspecto a considerar, e não antes de serem eliminadas todas as outras possibilidades.

Mas mesmo quando fica claro que o outro não quer nos atender, isto não implica necessariamente que esteja de implicância, que esteja contra nós, que seja nosso inimigo. Muito mais do que julgar a reação, precisamos nos esforçar para compreender a intenção por trás da ação. Todo ser humano age para atender aos seus interesses pessoais, o que parece egoísta à primeira vista. Mas é importante sabermos que cada interesse obedece a um propósito maior que NUNCA fica explícito no comportamento.

Portanto, antes de julgarmos as pessoas por suas ações, devemos procurar descobrir qual é o verdadeiro propósito por trás da ação. No caso da televisão, você pode está querendo aumentar o volume para ouvir o noticiário, ou mesmo a novela, que são os seus interesses do momento. Mas esses interesses atendem a um interesse maior de ficar bem informado com os acontecimentos do mundo, interesse esse que se conecta ao propósito de vida de viver uma vida plena, feliz. As ricas imagens da programação, os bilhões de combinações de cores, junto com as vozes das pessoas, os ruídos de fundo, a música..., tudo pode somar ao seu propósito maior de ser feliz.

O interlocutor também quer ser feliz. E infelizmente os bilhões de cores que tanto lhe agradam, podem ser altamente agressivos aos seus nervos óticos. As mesma voz belíssima daquela atriz maravilhosa poder soar como uma verdadeira agressão aos tímpanos do outro. O noticiário da guerra do Iraque que você está procurando acompanhar com tanto interesse, poder ser tudo que se desalinha com o ideal de um mundo de paz da outra pessoa. Se fere o interesse da pessoa naquele momento, certamente vai ferir o seu propósito maior escondido no comportamento aparente.

Há ainda outras coisas a analisar: a outra pessoa pode estar cansada, com dor de cabeça; pode estar querendo refletir, vivendo problemas pessoais que não está conseguindo gerenciar devidamente. E tudo o que ela não está querendo é ver, muito menos ouvir televisão, o que contraria os seus interesses daquele momento, que estão alinhados com o propósito de uma vida plena e feliz.

Quando analisamos as dificuldades da comunicação, seja por falha no processo comunicativo, ou por questões de divergências pessoais, podemos facilmente concluir que a maioria dos conflitos resultam da falta de reconhecimento das necessidades do outro por uma das partes. As pessoas defendem os seus interesses pessoais com tanta veemência, não por uma questão de egoísmo, mas pela mera necessidade de preservar a própria vida e o seu direito de ser feliz. É importante lembrar que assim como defendemos nossos interesses por uma questão de sobrevivência, a outra pessoa também defendendo a própria vida quando defende seus interesses.

Comunicar é negociar interesses imediatos para alcançar resultados de curto, médio e longo prazos, que se alinhem com nossos propósitos maiores de existência. Aprender a ler nas “entrefalas” o que o outro realmente quer quando comunica alguma coisa é imprescindível para o sucesso na comunicação. Mais importante do que qualificar o outro de egoísta por estar defendendo os seus interesses é negociar um meio de atender os nossos próprios interesses, ao mesmo tempo em que respeitamos e valorizamos os interesses da outra pessoa.